segunda-feira, 27 de abril de 2020

O Brasil vai virar o novo epicentro da pandemia de coronavírus?

Algumas regiões do país já sofrem para dar atendimento adequado a pessoas com a Covid-19.

Começou na China, migrou para a Europa e hoje assombra os Estados Unidos. Tudo indica que o epicentro da pandemia do coronavírus troca de lugar à medida que o patógeno se alastra por uma nova nação e suas autoridades de saúde conseguem criar ou não uma resposta rápida e eficiente para detê-lo, além de dar suporte adequado a quem fica doente.
O comportamento imprevisível desse vírus é uma das maiores angústias no enfrentamento da pandemia. E os médicos e cientistas reforçam esse ponto a todo momento diante de qualquer exercício de futurologia. Mas a experiência de outros países e os avanços nos dados epidemiológicos e nas medidas de contenção adotadas nos ajudam a vislumbrar se o Brasil corre o risco de sofrer mais ou menos com a Covid-19.
Afinal, nosso país pode virar o novo epicentro da pandemia? Fizemos essa pergunta a nove especialistas. Acompanhe as respostas a seguir.
José David Urbaéz, infectologista da Secretaria de Saúde do Distrito Federal e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI):
Infelizmente, acho que sim. Os dispositivos de isolamento social, corretamente aplicados por governadores e prefeitos, na medida em que conseguiram achatar a curva de desenvolvimento da epidemia, paradoxalmente fizeram com que a população interpretasse que o problema do coronavírus “não era tudo isso que falavam”, abandonando lenta e progressivamente o confinamento.
A isso se soma uma dicotomia reducionista e absurda de saúde versus economia, apoiada por vários setores empresariais, nos quais domina o pensamento de que “algumas mortes” pelo coronavírus seriam menos relevantes que a parada da economia.
Estamos em um país com uma enorme desigualdade socioeconômica. Isso significa que grande parte da população não tem acesso a saneamento básico, mora em condições de superlotação, tem pouca ou nenhuma compreensão da grave situação que estamos vivendo e será exposta a um vírus de alta transmissibilidade. A pandemia entrou no Brasil pelas classes alta e média alta, sendo que agora penetra nas áreas socialmente mais vulneráveis, onde sem dúvida alcançará proporções catastróficas.
A infraestrutura de saúde pública, o SUS, faz tempo vem sendo desmontada, com redução de verbas e investimentos, em todas as suas áreas, como diagnóstico, assistência hospitalar e de UTI, atenção primária… Cada vez mais precarizada, terá dificuldades significativas para responder ao desafio que representa esta epidemia. Apesar disso, continua sendo um sistema de grande capilaridade, que possui mecanismos de resposta para situações de gravidade, o que ameniza e muito as consequências do problema.
E, finalmente, há um componente extremamente grave: a decomposição das esferas do poder do Estado, que tem no chefe do Executivo Federal um fomentador do caos e do negacionismo, reduzindo a enfermidade a uma “gripezinha”, contrariando as recomendações baseadas em evidências científicas, desautorizando cientistas e médicos, induzindo comportamentos de exposição à virose como aglomerações em atos públicos… Isso, em última análise, cobrará um preço elevado em vítimas e no gerenciamento dos serviços de saúde. Causa perplexidade assistirmos a uma verdadeira guerra contra as medidas de isolamento em um momento tão delicado.

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